Desde que me lembro da minha (já longa) existência, o cinema sempre fez parte da minha
vida. Quando pequenina, em Luanda, a minha mãe, sempre curiosa com o gossip das vidas das divas do cinema hollywoodesco, comprava fan magazines e deliciava-se com as fotografias glamorosas que a faziam sonhar com uma vida de romance e aventura, longe da
domesticidade entediante que lhe ensombrava o espírito.
E foi assim, através dela, que me comecei a maravilhar com o big screen. Mais tarde percebi que o cinema vai tão além das stars, elas próprias uma commodity, construção de uma indústria tão complexa onde a produção e a realização por vezes se harmonizam e outras vezes se antagonizam.
A noção do realizador como autor, a chamada auteurist theory, já foi tantas vezes colocada em questão, precisamente porque há quem sublinhe que um realizador nunca é totalmente livre pois éforçado a compactuar com o big business da indústria cinematográfica.
No entanto, o auteurism continua a atrair-nos, basta pensarmos no cinema de Alfred Hitchcock, no cinema de John Ford (esse maravilhoso master do Western) e em fenómenos mais recentes tais como Quentin Tarantino, Jim Jarmusch, David Lynch e a lista nunca mais acabaria.
Poderia falar-vos dos filmes da minha vida… seria incapaz de escolher um. Apocalypse Now (Francis Ford Coppola, 1979) inquietou-me, The Deer Hunter (Michael Cimino, 1978) angustiou-me, The Wild Bunch (Sam Peckinpah, 1969) fez-me amar o Western e Taxi Driver (Martin Scorsese, 1976) arrebatou-me…tantos, tantos outros. O cinema sempre fez parte de mim.
Quem não se lembrado final do Gone with the Wind (Vitor Fleming, 1939) quando finalmente Rhett Butler (ClarkGable) disse à sua amada Scarlett (Vivien Leigh),que o tinha sempre colocado em plano secundário em detrimento do seu grande amor pelo Ashley, esse ser anódino e desinteressante (sim, porque o amor não se explica!): “Frankly my dear I don’t give a damn”.
Quem não se lembra de Robert Duvall a proferir as inesquecíveis palavras “I love the smell of napalm in the morning” nesse filme maravilhoso onde a própria rodagem já foi, por si só, uma alucinação? E quem pode esquecer Marlon Brando no Godfather (Francis Ford Coppola 1972) a balbuciar do alto da sua figura misteriosa e solitária, as sentenças de morte resultantes do seu estranho código de honra?
Fico-me por aqui…ontem revi Lost in Translation (Sofia Coppola, 2003) e mais uma vez senti o calor no coração e, tal como sempre me acontece quando revejo este filme, pergunto-me o que será que Bill Murray sussurra ao ouvido de Scarlett Johansson naquela despedida tão
dolorosa, porque talvez nunca mais se encontrarão neste vórtice que é a nossa vida, feita de
pequenos e grandes encontros. Fica entregue à nossa imaginação.
É a magia do cinema…beyond popcorns!
Elsa Andrade
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