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Carolina Bastos Pereira

A Pior Pessoa do Mundo e o futuro do cinema europeu

Escolhas: são o terror do Homem Moderno. A inconstância das ideias, das vontades, do amor e do feed do Instagram fazem com que, no século XXI, se projete que os jovens mudem de emprego 13 vezes ao longo da vida, que haja cada vez mais estudantes a mudarem de curso superior e que nos Estados Unidos os homens contem, em média, 32 parceiras sexuais. A inquietação, trazida pelo consumo instantâneo e pelo materialismo a que nos fomos acostumando, alia-se à proliferação da informação-base do ser pensante, conhecida por todos, mas desconhecida por muitos: vamos todos morrer! Forma-se, assim, com estes ingredientes e uma pitada de aleatoriedade deambulante, o Homem Moderno.


O Homem Moderno quer já o amanhã, mas nunca sabe o que lhe apetece hoje para o almoço (há tantas possibilidades!). O Homem Moderno preocupa-se com o ambiente e com os males sociais, mas quer ser livre, fazer o que lhe apetece. O Homem Moderno quer ser médico, e depois psicólogo, e depois fotógrafo, e depois escritor, como é o caso de Julie, A Pior Pessoa do Mundo, que tem crises existenciais constantes e um pavor crescente de não deixar nenhuma marca no planeta depois da sua morte. Namora com vários homens, mas não “fica” com nenhum, porque nunca encontra a estabilidade que procura, deseja sempre o que não pode ter e vê o telemóvel como uma extensão do seu pensamento, como chave de acesso a uma realidade imaterial de possibilidades e que, por serem invisíveis, são alcançáveis.


A Pior Pessoa do Mundo, obra norueguesa de 2021 realizada por Joachim Trier, inicia-se, justamente, com Julie a manusear um telemóvel, abstraindo-se do mundo real (demasiado penoso?). Ao longo do filme, o espectador é conduzido por um caminho oscilante de emoções, que não terminam quando termina a película. Na verdade, esta acompanha apenas 4 anos da vida de uma mulher que nunca vai parar de mudar, pois tem horror à estabilidade e à resignação.


Este reflexo do mundo real, nas suas constantes transformações e crescentes angústias, é cada vez mais exibido no cinema, em especial no cinema independente europeu (que se despoja de grandezas e aparatos hollywoodescos), e é certamente para lá que ele caminha. O Homem Moderno é cada vez mais insaciável e sente-se cada vez mais incompreendido e sozinho num mundo globalizado e disperso. É reconfortante podermos olhar para cenas gravadas a cru, sem planos de câmara elaborados, retirando o melhor proveito da beleza natural das paisagens e dos rostos, e sem atuações exuberantes ou excessivamente comoventes, e vermo-nos espelhados ali, no carácter autodestrutivo e inquieto da Pior Pessoa do Mundo.



Carolina Bastos Pereira

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