Xavier Dolan, menino prodígio do cinema canadiano realizou em 2010 este filme “Les amour
Imaginaires” , um filme delicado sobre a complexidade do amor (ou não) e sobre a forma
como procuramos nas relações algo que em nós está em falta, algo que nos preencha; a tal
projeção no espelho que o Lacan dizia ser mais completa e perfeita do que aquilo que
realmente somos.
Dolan, também actor, entra aqui como François, um jovem homossexual que,
juntamente com a sua melhor amiga, Marie, apaixonam-se por Nico, um jovem belo e
narcisista, interpretado por Niels Schneider. Consciente da sua própria beleza, Nico utiliza os
seus poderes de sedução para os “aprisionar” à sua imagem, para os cativar e enredar a ponto de colocar a amizade que os unia em perigo.
Dolan intercala o enredo do seu filme com pequenas cenas de entrevistas a várias pessoas, homens e mulheres, que falam das suas relações, das suas pequenas obsessões amorosas dando um toque de cinema verité, quase documental, ao seu plot. Quando percebe o que suscitou nos dois amigos, Nico desfaz o “equívoco”, dizendo a François “Como pudeste pensar que eu era homossexual?” e dizendo a Marie, que lhe dedica um poema de amor, que tem que ir para casa porque deixou o forno ligado. A mundanidade das suas desculpas, o seu afastamento físico, acabam por causar uma dor profunda em François e Marie e o filme explora o processo de “healing”, de recuperação de um amor fracassado.
Quando avistam Nico numa festa, passado um ano, François e Marie afastam-no com frieza, ele é agora apenas um rosto que perdeu o seu glamour, o seu ar de arcanjo- parecendo uma versão adulta do jovem de Death in Venice de Luchino Visconti- perdeu totalmente o seu poder de encantamento. O filme coloca-nos esta questão: o que nos impele para o Outro, o que nos faz amar, será o amor imaginário? Será que projetamos no Outro uma fantasia que alimentamos mas que no final se revela um equívoco, um mal entendido, reflexo de uma busca sempre infrutífera porque parte do plano imaginário, da nossa necessidade incessante de sermos também nós um objeto de desejo, mesmo que
obscuro, como no filme do Bunuel?
J’ai tué ma Mére ,(2009) , Lawrence Anyways (2012), Juste la fin du monde (2016) e o mais recente Matthias &Maxime (2019) têm afirmado Dolan como um dos nomes mais interessantes do cinema indie Canadiano - por vezes queer na sua abordagem delicada, e ao mesmo tempo complexa, da homossexualidade, transexualidade, do amor enfim…
Elsa Andrade
Elsa; subscrevo a ( "tua" ) tese de que, em grande medida, o que denominamos , por vezes, por amor, não é senão uma Projeção de um Outro que tornamos objeto idealizado. Equívocos sem os quais a vida não teria sabor.
O s equívocos podem ser pretextos para nos transcendermos e descobrirmos com maior intensidade um universo só nosso.
Obrigada pela partilha.
Tenho que ver o filme :)